Edgard Leite Ferreira Neto
Para Buddha, somos como a espuma que se forma no rio Ganges. Não temos substância. Seguimos pelo rio, que é a existência, sem que exista algo que possa sobreviver à correnteza. E se não há substância, que podemos saber do rio? Muitos, em sua época, acharam essa figura assustadora. E nós, com a modéstia de homens tementes a Deus, também achamos.
Negar a nossa essência eterna é fácil, hoje em dia. Como o era na época de Buddha. A consciência vê em tudo o desaparecimento, a mudança, o exaurir dos desejos. Sua recolocação e, de novo, exaustão. Assim, também, presumem muitos, a vida é. Logo, espuma. E toda nossa cultura midiática também entende assim.
Mas parece evidente que essa atrocidade, essa negação da essência, conduz o ser humano ao fim de sua humanidade, pois desqualifica tudo que há em nós que perdura, que é o que nos torna algo. Mas quanto mais o ser se dissolve, mais emerge a necessidade de reencontrá-lo. Afirmá-lo.
E tal afirmação se impõe à consciência, como uma das maiores inquietudes da existência. Como é possível amar sem que esse sentimento evoque a permanência? Ou, como podemos desejar a permanência se tal realidade não existe em nós? Diz a Escritura que Deus "tudo fez formoso em seu tempo; também pôs na mente do homem a ideia da eternidade”(Ec 3:11).
A obra de Deus no mundo se apóia na nossa capacidade de encontrar a verdade. Que pela Sua palavra redentora chega ao nosso coração. Num mundo repleto de elementos vagos e transitórios, é certo e bom que nos voltemos para os fundamentos que traduzem o infinito sagrado. E reencontremos a nossa alma.
Peregrinam conosco criaturas divinas. Com elas, no nosso cotidiano, podemos ser contemplativos e profundos, e, ao mesmo tempo, deslizar pelo rio Ganges. Mas nunca como espuma, mas como navegantes. Deslizamos pelo rio, nele atuando, trabalhando, lidando com a contínua evaporação das coisas. Na correnteza que desagua, afinal, no oceano da eternidade. Para o qual a nossa eternidade foi preparada.
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