A morada do Homem é um estudo sobre o pensamento iluminista e como este atuou no sentido de eliminar o encantamento humano diante do milagre e do extraordinário. Segundo Edgard Leite, para atingir tal objetivo, o Iluminismo atacou “a experiência de eternidade e de atributos eternos, morais e éticos”, reduziu o ser humano a números e estatísticas e promoveu ações de controle social nunca antes vistas. E, nesse movimento, a invasão da família pela esfera pública desempenhou um papel central.
Edgard Leite nos apresenta, neste ensaio de história das ideias, uma visão sobre as sociedades iluministas e conclui que a guerra do Iluminismo é, acima de tudo, ato de beligerância contra a pessoa. Para destruir a capacidade humana de perceber e se maravilhar com o surpreendente, atacou tudo que é íntimo, reservado e singular, o que não pode ser explicado, e inseriu o ser humano numa ilusão contínua e frustrante de que é capaz de tudo entender e dominar.
Para o autor, o discurso iluminista busca, assim, eliminar “o encanto com o milagre da existência” e, igualmente, o assombro com o milagre da própria existência pessoal. A morada do Homem é um convite irrecusável para relembrarmos que a “morada interna humana é a nossa residência e o meio pelo qual nos reencontramos permanentemente com nossa essência eterna e com nossa fonte e destino”.
Trecho da Introdução de A morada do Homem:
"Este livro aborda um pequeno movimento do pensamento iluminista cuja amplitude é, no entanto, significativa. Trata-se da crítica aos milagres, ou do extraordinário que emerge, de forma surpreendente, na experiência diária da vida. Tais fenô- menos sempre foram entendidos como sinais da existência de uma natureza superior, que invade este mundo com uma fre- quência que a pessoa pode identificar, ao ser atenta a eles. A or- dem que a sua ocorrência traduz é maior, em poder e magnitude, que a ordem deste mundo e seu acontecimento é testemunho de um sentido que transcende a natureza e é dotado de profundo mistério: sua realidade corrobora visões e revelações.
A crítica aos milagres é, portanto, um movimento que se insere na crítica geral ao sentimento religioso, realizado pelo Iluminismo. Ela tem uma centralidade na argumentação ego- cêntrica que se instala entre os intelectuais e todos que perce- bem como é agradável tornar-se, de alguma forma, senhor do mundo. É fundadora de muita coisa porque, a partir dela, es- tabelece-se uma crítica à vivência sensível de Deus. E como tal experiência passa a ser considerada, principalmente, um equí- voco humano, pois fruto da ignorância de suas razões reais. O Deus da Bíblia adquire a feição de qualquer outra coisa, menos a de um Deus criador. Nessa crítica é desqualificada a grande experiência de eternidade e de atributos eternos, morais e éti- cos que os milagres testemunham".
Sumário de A morada do Homem:
Agradecimentos 11
Introdução 13
Materialidades e imaterialidades 18
A pessoa e sua singularidade 25
O valor da desigualdade 32
O desprezo pelo extraordinário 38
A morada do Homem 45
Diagnósticos gerais e particulares 52
A formação do embrião 63
Mudar o Homem? 75
O sono da razão 83
O terremoto de 1755 92
A torre de Babel 100
Alcançando o céu? 108
Circunstâncias 115
A dinâmica da dissidência 123
A febre do ouro 133
A transmutação dos elementos 143
O puro desespero do crédito 151
Não desejar a Deus 167
O ensino da descrença 179
As fragilidades da ciência 187
Desmantelando a família 196
A defesa da intimidade 207
Conclusão: o sentido misterioso do extraordinário 221
Referências bibliográficas 227
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